terça-feira, 13 de julho de 2010

A luneta Mágica

Chamo-me Simplício e tenho condições naturais ainda mais tristes que meu nome.
Nasci sob a influência de um estrela maligna, nasci marcado com o selo do infortúnio.
Sou míope; pior do que isso, duplamente míope, míope física e moralmente.
Miopia física: - a duas polegadas de distância dos olhos não distingo um girassol de uma violeta.
E por isso, ando nas cidades e não vejo as casas.
Miopia moral: - sou sempre escravo das idéias dos outros; porque nunca pude ajustar duas idéias minhas.
E por isso, quando vou às galerias da câmara temporária ou do senado, sou consecutiva e decididamente do parecer de todos os oradores que falam pró e contra a matéria em discussão.
Se ao menos eu não tivesse consciência dessa minha miopia moral!... Mas a convicção profunda de infortúnio tão grande é a única luz que brilha sem nuvens no meu espírito.
Disse-me um negociante meu amigo que por essa luz da consciência represento eu a antítese de não poucos varões assinalados que não têm dez por cento de capital da inteligência que ostentam e com que negociam na praça coisas públicas.
- Mas esses varões não quebram, negociando assim?... perguntei-lhe.
- Qual! são as coisas públicas que andam ou se mostram quebradas.
- E eles?...
- Continuam sempre a negociar com o crédito dos tolos e sempre se apresentam como boas firmas.
Na cândida inocência da minha miopia moral não pude entender se havia simplicidade ou malícia nas palavras do meu amigo.

Joaquim Manoel de Macedo. A Luneta Mágica.
São Paulo: Saraiva, 1961. p. 1-2.

Um comentário:

  1. Olá sou sua seguidora, tão simples e cheio de palavras que parece comigo. Mas enfim amei é perfeito, amei pode passar por aqui, amo estar no cantinho desconhecido de alguém e ainda poder falar de mim, espero que possa ser sua seguidora fiel e passar aqui pra dizer um OI.

    Bjs até a próxima!

    ResponderExcluir